“A oração é a vida de nossa vida e a alma de nossa alma. É como a respiração. “Abro a boca suspirando porque desejo teus mandamentos” (Sl 118, 131). (Cf.São Gaspar BERTONI,Gramática N.225). Diante deste pensamento do nosso Fundador, quero refletir neste artigo a importância da oração em nossa vida. Ao realizar Exercícios Inacianos de trinta dias no mês de janeiro deste ano, confesso que pude entender melhor o que São Gaspar queria dizer ao propor que todos os membros da Congregação fizesse esta experiência.
Se a oração é a “vida de nossa vida”, será a oração uma forma de humanização? Quem é o ser humano que ora? É oração refletir o mistério do próprio ser? É oração o ato de quem admira a grandeza do próprio universo ou tenta compreender o significado de sua própria existência? Quantas reflexões poderiam surgir diante deste tema, para entender o que São Gaspar quis dizer com esta expressão. Cada pergunta é como um novo caminho que se abre em nossa vida nos apontando para o sentindo da nossa existência.
“O termo orar vem do latim orare, que significa falar. Orar é falar com Deus de si próprio, do que acontece consigo mesmo, do que se deseja. Falamos também, sobre os outros e sobre seus problemas. A oração é um diálogo entre duas pessoas que falam, escutam e respondem” ( Cf. Martin NETO, Pai Nosso: a oração da Utopia, 2001, p.8.) Orar significa voltar-se para Deus e adquirir consciência da própria vida. Orar é chegar no silêncio de si mesmo e das coisas ao diálogo íntimo com Ele. Orar é estabelecer um diálogo íntimo de você a você, de pessoa a pessoa, de coração a coração.
Para acolher no íntimo do coração a beleza desta expressão “vida de nossa vida”, é preciso voltar o olhar para a pessoa de Jesus Cristo. São Gaspar tinha o olhar e o coração fixos no Senhor. Esta expressão é fruto de uma amizade verdadeira e íntima com uma Pessoa que foi o sentindo último de sua vida. Na sua atitude de consagrado, São Gaspar Bertoni, agiu como discípulo que em tudo quis imitar o Mestre: “Uma das características mais fundamentais de Jesus Cristo é a oração, tanto assim que podemos defini-lo como uma ‘pessoa orante’. Sua vida foi uma oração continua em permanente diálogo com o Pai”.( Cf. Martin NETO, Pai Nosso: a oração da Utopia, 2001, p.10.) Desta forma, a oração é gesto de tipo pessoal, é a experiência do encontro com Deus, por meio de palavras que brotam do próprio coração em atitude de escuta reverente iluminando todas as dimensões da vida.
A oração torna-se fonte de vida, é um exercício que nos leva a conhecer a própria identidade. “Sem a oração o homem não chega à verdade nem descobre seu nome. Nossa existência é dom, somos chamados pela palavra criadora de Deus e esta palavra é convite para vivermos conscientemente em sua presença. Vivendo através do chamado que nos dá vida, podemos encontrar na escuta e na resposta diante de quem nos dá um nome único e tudo o que somos. Não podemos encontrar nossa identidade a não ser voltando-nos para Deus que é origem e fim de nossa vida.”(Cf.Stefano de FIORES & Tullo GOFFI. Dicionário de Espiritualidade. 1989. p. 842.)
Para uma pessoa de oração todas as coisas trazem a marca da iniciativa divina e convidam, ao louvor, à gratidão e à adoração. Deus fala mediante as realidades criadas. Tudo foi criado no verbo: Todas as obras de Deus são palavras, mensagens, dons e convites para dar-lhe graças e alegrar-nos. Em todo o tempo vive-se na presença do Senhor: “Acompanhemos cada ação por meio deste espírito. Estamos na sala de aula, mas o coração em Deus; na Igreja, mas o coração em Deus; cantando, à mesa, num passeio, em estudos, dormindo, mas o coração em Deus.” (Cf. São Gaspar BERTONI, Gramática, N. 226)
Quanto mais uma pessoa progride na oração, tanto maior é sua admiração pela criação, porque tudo fala da grandeza, da majestade, da sabedoria de Deus: “Deus está presente em nós e em nosso próximo como criador, redentor e artífice que leva adiante para acabá-la, a obra que tão maravilhosamente começou. Esta obra prima, é convite para colaborarmos com ele; devemos ser co-artífices e co-reveladores do seu amor.”( Cf. Stefano de FIORES & Tullo GOFFI. Dicionário de Espiritualidade. 1989. p. 843.)
A oração é um encontro que humaniza, nos possibilita romper as amarras da vida e fazer a experiência do “via-a-ser”. Na oração não encontro somente a Deus, mas também aos meus irmãos e minhas irmãs de modo novo. A oração é dinâmica, nos coloca em movimento, nos faz ir e vir a todo instante. Pela oração nos tornamos sempre novos, nos recriamos, nos reinventamos e nos colocamos na postura de discípulo que não se cansa de seguir o Mestre. “A imitação do Mestre não era um aprendizado teórico. Quem seguia Jesus devia comprometer-se com ele e "estar com ele nas tentações" (Lc 22,28), inclusive na perseguição (Jo15,20; Mt 10,24-25). Devia estar disposto a carregar a cruz e a morrer com ele (Mc 8,34-35; Jo 11,16). Isto exige de nós um compromisso concreto e diário de fidelidade com o mesmo ideal comunitário com que Jesus, fiel ao Pai, se comprometia.”(CNBB, Terceira Semana Brasileira de Catequese, Brasília, Edições CNBB,2010.p.127)
Para São Gaspar a oração era sua escola de formação. A oração verdadeira nos forma e conduz sempre a um encontro profundo com as pessoas e com o mundo. Este encontro pode acontecer rezando e pensando conscientemente, indo ao encontro do outro ou entrando na própria alma para sentir-se unido ainda mais profundamente com todos. Rezar é como dar o próprio sangue pelos outros, ir ao encontro do outro com todo o seu amor e com toda a dedicação; sofrer com ele, colocar-se juntamente com o outro diante de Deus e ofertar-se com ele a Deus.“A formação dos discípulos missionários precisa articular fé e vida e integrar cinco aspectos fundamentais: o encontro com Jesus Cristo; a conversão; o discipulado; a comunhão; a missão. O processo formativo se constitui no alimento da vida cristã e precisa estar voltado para a missão, que se concretiza em vida plena, em Jesus Cristo, para todos, em especial para os pobres. A formação não se reduz a cursos, pois integra a vivência comunitária, a participação em celebrações e encontros, a interação com os meios de comunicação, a inserção nas diferentes atividades pastorais e espaços de capacitação, movimentos e associações.” (Cf.DGAE 2011-2015 n.91)
A oração derruba os muros entre os homens, abre portas fechadas e nos liberta das correntes que nos impedem de encontrar o outro. Deste modo, a oração cria um mundo possível. Contudo, para todos nós que abraçamos a espiritualidade bertoniana como forma de seguimento a Jesus Cristo cabe seguir os métodos do nosso Fundador relatado em suas anotações: “Para alguém poder receber e conservar as inspirações de Deus tem que valorizar a solidão, a paz, o silêncio interior e exterior; caso contrário, ou não vai recebê-las, ou, se recebidas, enfraquecer-se-ão e desaparecerão”(Cf. São Gaspar BERTONI, Gramática, N.228)
Pe. Jordélio Siles Ledo, CSS
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