Congregação dos Sagrados Estigmas De nosso senhor Jesus CristoPresente no Brasil desde 1910
Província Sta. Cruz

Discurso do Papa Francisco aos Estigmatinos

Discurso do Papa Francisco aos Estigmatinos

DISCURSO DO PAPA FRANCISCO 
AOS PARTICIPANTES NO CAPÍTULO GERAL DA CONGREGAÇÃO
 DOS SAGRADOS ESTIGMAS DE NOSSO SENHOR JESUS CRISTO 
(ESTIGMATINOS )

 Sala do Consistório
Sábado, 10 de fevereiro de 2018

 

Gostei daquilo que me disse o [Superior] Geral “concludente” [cessante]. Preparei este discurso para vós, mas enquanto ele falava senti coisas dentro de mim e dirigir-vos-ei palavras improvisadas. E D. Gänswein dar-vos-á a cópia oficial do discurso. Falaremos aqui com aquilo que me veio de dentro, concordais?

Uma coisa que me impressionou foi a fraternidade: o Padre-Geral falou da fraternidade, que talvez se tenha debilitado um pouco... Não é fácil viver a fraternidade. A fraternidade religiosa, a vida comum... Também o nosso São João Berchmans dizia que «mea maxima poenitentia, vita communis». A vida de comunidade, a vida de fraternidade é difícil porque existem problemas humanos, invejas, competitividade e incompreensões: muitas coisas que todos nós temos, todos, eu em primeiro lugar. Todos. Estar consciente disto é muito importante para ser compreensivo na vida comunitária. E chegar a ponto de poder falar como irmãos. Pois bem. E às vezes, quando falamos como irmãos, dizemos coisas que não agradam. Mas falemos como irmãos, ou seja, com caridade, doçura e humildade, contudo sem esconder as coisas, não. Uma das coisas claras — a mais clara da vida comunitária — é poder falar como irmãos. Talvez o irmão te diga algo que não te agrada, mas sem rancor: «Fez-me isto, e vai pagar!». Isto não é bom. Mas a fraternidade é uma graça, e se não houver oração, esta graça não virá. «Sim, eu recito o ofício, rezo, medito o Evangelho...». Sim, sim, mas rezas por este irmão, pelo outro, por aquele, pelo Superior? A oração concreta pelo irmão. A oração concreta pelo irmão. E isto faz o milagre da fraternidade. E por vezes, nas reuniões de comunidade, há discussões, mas há altercações inclusive nas boas famílias, nos bons casamentos. Discutir não é pecado. Pecado é o rancor, o ressentimento que deixa dentro do teu coração o facto de ter altercado; mas discutir é dizer aquilo que se pensa, respirar o ar da liberdade como irmãos. Não tenhais medo. Sem ofender, mas dizer as coisas como são. E depois ter a coragem de falar como o Evangelho nos ensina: se tiveres algo contra o teu irmão, ou se souberes que ele tem algo contra ti, diz-lhe. Diz-lhe à parte. E depois, se a situação não se resolver, fala em comunidade, mas fala. Não engulas o que é indigesto, estes problemas não se digerem.

Exorto-vos a caminhar, na vida comunitária, por este caminho da verdade, da liberdade, com muita caridade e oração, mas a caminhar assim, sem medo. Não tenhais medo. É desagradável que eu, religioso, não tenha a coragem de dizer na cara aquilo que penso ao meu irmão, mas vou por detrás e digo-o a outro. Isto é tagarelice. Permiti-me esta palavra: é a bisbilhotice dos “solteirões”. E nós emitimos o voto de castidade, não de “solteirice”, não, de castidade: é outra coisa. E em vez de sermos castos, tornamo-nos “solteirões”. E o que é pior do que ser solteirão, ou solteirona? Renunciar à paternidade, à maternidade. É interessante: quando alguém não renuncia à paternidade espiritual, procura vivê-la plenamente; e vive melhor a fraternidade na comunidade. Ao contrário, a bisbilhotice é um álibi: assim julgas resolver o problema, mas não resolves nada. Desabafas um pouco, mas desabafas como um “solteirão”. Muitas vezes, talvez tenhais ouvido como eu chamo às tagarelices: o bisbilhoteiro é um “terrorista”. Porque a tagarelice, o bisbilhotar contra o outro é um ato de terrorismo, porque vou com a bomba na mão, lanço a bomba, destruo o irmão e vou-me embora tranquilo. E depois, quem ressuscita a reputação do irmão? Pratico o mal por trás. É um pouco calúnia, ou difamação. Às vezes posso ter razão, mas cometo uma difamação: tiro-lhe a boa reputação. E vem-me ao pensamento aquela anedota de São Filipe de Néri, sobre a galinha: sobre a mulher que foi confessar-se pelas tagarelices, e como penitência foi-lhe dito que devia depenar uma galinha — conhecei-la? — e depois voltou: «E agora procura recolher as penas». Não se pode. É assim. Destruíste, uma vez que semeaste as calúnias, ou as bisbilhotices, as difamações. O diabo é astuto: usa isto, que é uma nossa debilidade. É astuto!

Fraternidade. Por favor, conservai a fraternidade. Isto não quer dizer que todos devemos ser amigos íntimos. Não, irmãos. Com o respeito, as regras do respeito, as regras da liberdade, a estima e a oração, de uns pelos outros. E sobre isto peço-vos que façais um exame de consciência. Durante estes dias, antes das eleições, fareis um exame de consciência, tanto da comunidade como vosso. Também sobre isto: a fraternidade.

A segunda dimensão é o vosso nome, que vem dos estigmas. Gosto muito disto. São Bernardo diz que o Verbo de Deus que se fez homem é um “monte de misericórdia”, que na Paixão, com os estigmas, foi derramada sobre nós. Os estigmas do Senhor, as chagas do Senhor são precisamente a porta de onde provém a misericórdia. Aquele “monte de misericórdia”, que é Jesus Cristo. E São Bernardo continua, seguramente já lestes isto: se me sinto deprimido, se pequei demais, se fiz isto, isso, aquilo... vou e refugio-me nas chagas do Senhor. Estais conscientes de que sois “chagados”. Cada um de nós é “chagado”, e resolve a própria vida, se a une às feridas do Senhor. Somente a consciência de uma Igreja “chagada”, de uma Congregação “chagada”, de uma alma ou de um coração “chagado” nos leva a bater à porta da misericórdia, nas feridas do Senhor. Quem sabe que é “chagado” busca as feridas. Procurai este texto: a contemplação das chagas do Senhor consiste em entrar nas suas feridas. De São Bernardo. É uma bonita figura, gosto muito dela! O “monte de misericórdia” que se abriu para todos nas chagas do Senhor. Também isto é interessante: as pessoas que não se sentem “chagadas” pelo pecado não entendem as feridas de Jesus. Às vezes ouve-se dizer: «Mas esta devoção às chagas de Jesus é um pouco medieval...». Aquela pessoa não se sente “chagada”. «Fomos curados pelas suas chagas» (cf. 1 Pd 2, 24). Exatamente ali: a chaga do Senhor. E como diz aquela bonita oração: «Esconde-me nas tuas chagas» (Anima Christi). Oculta-me da minha vergonha. Esconde-me da ira do Pai. Oculta-me da minha miséria. Mas nas tuas feridas. Não tenhais vergonha da devoção às chagas do Senhor. É o vosso caminho de santificação. Ensinai às pessoas que todos nós somos “chagados”. O pecador “chagado” só encontra perdão, paz e consolação nas feridas do Senhor, não alhures. Esta foi a segunda coisa que me veio ao pensamento, enquanto falava o Padre-Geral.

E a terceira é a Sagrada Família. Jesus, Maria e José. Sempre dóceis para cumprir a vontade de Deus. Maria, a Mulher “da pressa”. Gosto muito daquele trecho de Lucas, onde se diz que Maria foi «às pressas» ter com a sua prima, para a ajudar (cf. 1, 39). Nas Ladainhas seria bom inserir isto: «Nossa Senhora da pressa, orai por nós». Sempre às pressas, para ajudar. E José é o homem manso, que recebia as notícias nos sonhos. Dizem as más-línguas que, sendo já idoso, José sofria de insónia, não conseguia dormir. Mas era um problema psicológico: assustara-se porque, cada vez que tinha adormecido, trocaram-lhe os planos! É um homem aberto às revelações do Senhor. E com a mansidão, o trabalho... Mas unidos, juntos: a pressa de Maria, a mansidão forte, paciente de José... forte! Ele soube educar o Filho. A devoção a Nossa Senhora e a José. Não abandoneis estas devoções! Alguém pode dizer: «Mas são para crianças!». Sim, mas diante de Deus nós somos crianças. Se pudéssemos tornar-nos crianças diante de Deus! E à Mãe que vai às pressas, pedir: ajuda-me! E ir com Ele nos momentos difíceis. Os místicos russos dizem que nos momentos das turbulências espirituais, devemos ser cobertos pelo manto da Santa Mãe de Deus, e dali provém aquela primeira Antífona mariana ocidental: «Sub tuum praesidium confugimus, Sancta Dei Genitrix...». O manto da Santa Mãe de Deus. E José: o homem manso, o homem justo, o homem do silêncio, o homem da paciência, o homem do trabalho. Mas todos juntos, em família. Esta devoção ajudar-vos-á em grande medida, e o que vos digo não é um conselho para velhinhos, não! É para homens, para homens que devem ser fortes no anúncio do Evangelho. Ide ter com a Mãe, ide ter com aquele homem que serviu de pai e fez crescer o Senhor. E aprendei ali, em família.

Obrigado! Fazei uma boa devoção. Não vos esqueçais das chagas do Senhor. Não vos esqueçais da fraternidade entre vós. E não vos esqueçais de Nossa Senhora, sempre às pressas, e nem sequer de José, sempre no seu lugar, em obediência e mansidão. E rezai também por mim. Agora concedo-vos a Bênção!

DISCURSO PREPARADO PELO SANTO PADRE

Queridos irmãos!

Bem-vindos por ocasião do vosso Capítulo Geral eletivo. Saúdo-vos todos cordialmente, a começar pelo Superior-Geral, a quem agradeço as amáveis palavras. Vós provindes de quinze Nações nas quais vos comprometeis a levar o anúncio da Palavra de Deus em todas as suas formas, com uma atenção especial às jovens gerações e em colaboração fraterna com o clero diocesano. Agradeço-vos o que fazeis ao serviço do Evangelho e das populações que vos foram confiadas, e exorto-vos a reavivar em vós e nas vossas comunidades o fogo da Palavra de Deus: ele deve “incendiar” inclusive o coração de quantos se encontram nas periferias dos contextos urbanos e eclesiais.

No Evangelho, Jesus anuncia: «Eu vim lançar fogo sobre a terra, e como gostaria que já se tivesse ateado!» (Lc 12, 49). Imitando o Mestre divino, também vós sois chamados a levar o fogo ao mundo. Mas existe um fogo errado e um fogo bom, santo. O evangelista Lucas narra que certa vez Jesus, enquanto estava a caminho de Jerusalém, mandou à sua frente mensageiros que entraram num povoado de Samaritanos, os quais não os quiseram receber. Então os dois discípulos, e irmãos, Tiago e João, disseram: «Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para os consumir?» (Lc 9, 54). Mas Jesus voltou-se e repreendeu-os; e prosseguiram rumo a outra aldeia. Este é o fogo errado. Não agrada a Deus. Na Bíblia, Deus é comparado com o fogo, mas trata-se do fogo de amor, que conquista o coração das pessoas, não com a violência, mas respeitando a liberdade e os tempos de cada um.

O Evangelho deve ser anunciado com mansidão e alegria, como fez o vosso fundador, São Gaspar Bertoni. Este é o estilo de evangelização de Jesus, nosso Mestre. Ele acolhia e aproximava-se de todos, conquistando as pessoas com a bondade e a misericórdia, com a palavra penetrante da Verdade. Assim vós, discípulos missionários, que sois evangelizadores, podeis levar as pessoas à conversão, à comunhão com Cristo, por meio da alegria da vossa vida e com a mansidão. Nem sempre quem anuncia o Evangelho é acolhido, aplaudido. Às vezes é rejeitado, impedido, perseguido e até aprisionado ou assassinado. Vós conheceis bem isto! Então é preciso perseverar, ter paciência, mas não devemos ter medo de nada ao darmos testemunho de Jesus e da sua palavra de Verdade.

O fogo bom é o fogo de Jesus, d’Aquele que batiza em Espírito Santo e fogo: «Eu vim lançar fogo sobre a terra» (Lc 12, 49). É o fogo de caridade que purifica os corações e que se propagou da Cruz de Cristo. É o fogo do Espírito Santo que desceu com poder no Pentecostes. Fogo que separa o ouro dos outros metais, ou seja, que ajuda a distinguir o que vale eternamente daquilo que tem pouco valor. «Todos os homens — diz Jesus — serão salgados com o fogo» (Mc 9, 49). É o fogo das provações e das dificuldades que tempera, que nos torna fortes e sábios. É também o fogo da caridade fraterna. Os evangelizadores nascem e formam-se numa comunidade congregada em nome do Senhor, e por ela são enviados. «Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, Eu estarei no meio deles» (Mt 18, 20). O testemunho de amor de uma comunidade fraterna de missionários é confirmação do anúncio evangélico, é a “prova do fogo”. Se numa comunidade faltar o fogo bom, haverá frieza, obscuridade e solidão. Se houver o fogo da caridade fraterna, haverá calor, luz e força para ir em frente. E novas vocações serão atraídas para a dócil missão de evangelizar.

Estimados missionários estigmatinos, levai este fogo às comunidades cristãs, onde a fé de muitas pessoas tem necessidade de voltar a atear-se, de encontrar força para ser contagiosa. Ao mesmo tempo, ide, saí para anunciar o Evangelho aos pobres, Àqueles que não se sentem amados por ninguém, àqueles que vivem na tristeza e no desespero, aos prisioneiros, aos que não têm uma casa nem um teto, aos imigrantes, àqueles que fogem das guerras. São Gaspar Bertoni transmitiu-vos o amor pelos Santos Esposos, Maria e José. Portanto, prestai atenção especial à família; juntamente com os leigos, anunciai a alegria do amor. Levai o fogo de Cristo aos jovens, que precisam de alguém que os ouça e os ajude a encontrar o sentido da vida. Se anunciardes Jesus, eles serão atraídos; levai-os para Ele com paciência e perseverança. Sede missionários jubilosos e mansos, bem preparados para encontrar cada pessoa.

São Gaspar pensou na vossa Congregação para preparar missionários apostólicos que ajudem os Bispos no anúncio do Evangelho. Ser missionário, enviado pela Igreja, não é antes de tudo fazer algo, uma atividade, mas uma identidade. Quando Deus escolhe e chama para uma missão particular, ao mesmo tempo dá um nome novo, cria uma realidade sempre renovada. Jesus chamou-vos para permanecer com Ele como discípulos missionários. Por isso, em primeiro lugar tendes necessidade de cultivar e conservar a vossa comunhão com Ele, o Senhor, de contemplar a sua Face na oração, para o reconhecer e servir com amor no rosto dos irmãos.

Resplandeça nos vários campos do vosso serviço eclesial a adesão fiel a Cristo e ao seu Evangelho. A Virgem Maria e São José vos protejam e sejam guias seguros no caminho da vossa Família religiosa, para que ela possa levar a cumprimento todos os seus projetos de bem. Com estes votos, enquanto vos peço que oreis por mim, invoco a Bênção do Senhor sobre vós, sobre todo o Instituto e sobre quantos encontrais no vosso apostolado quotidiano. O Senhor inflame sempre a vossa missão com o fogo do Espírito Santo!